Por: Luis Antonio Texeira e Ana Palma
Filho de peixe, peixinho é, diz o ditado popular. E indo além: é preciso seres humanos para que haja bebês. Cabritinhos nascem de cabras, bezerros de vacas, girinos de sapos. Aves e répteis botam ovos. Fertilizados, eles dão origem a pintinhos, patinhos, passarinhos, bem como cobras, tartarugas e jacarés. Bactérias dividem-se para formar novas bactérias. É preciso vida para surgir uma nova vida. E, com raríssimas exceções, vida da mesma espécie.
Parece óbvio, não? Mas nem sempre foi assim. Durante muitos anos, acreditou-se que a vida poderia surgir de outros organismos e mesmo da matéria inanimada. Era a teoria da geração espontânea ou abiogênese. Acreditava-se que vermes surgiam da lama, insetos da carne “em decomposição. Algumas lendas chegavam a afirmar que gansos nasciam de árvores que tivessem contato com água do mar e, que algumas árvores produziam carneiros e que o estrume de vacas dava origem a vespas e abelhas.
Receita de vida
Vaga-lumes nascendo do orvalho, pássaros de frutas, plantas de cauda de cometas! Isso é coisa de gente ignorante. Nada disso: da Antiguidade ao século XIX, os mais famosos estudiosos defenderam a geração espontânea: Thales, Platão, Aristóteles, Galileu, Bacon, Descartes e Newton. O médico belga Jean Baptiste van Helmont, no século XVII, chegava a dar uma receitas para produzir animais vivos:
Ratos: Enche-se de trigo e fermento um vaso, fechando-o com uma camisa suja, de preferência de mulher. Um fermento vindo da camisa, modificado pelo odor dos grãos, transformará em ratos o próprio trigo.
Escorpiões: Faça um buraco em um tijolo e ponha ali erva de manjericão bem triturada. Aplique um segundo tijolo sobre o primeiro e exponha tudo ao sol. Depois de alguns dias, com o manjericão agindo como fermento, nascerão pequenos escorpiões
Que bobagem, não? Nem tanto… Se pensarmos bem no assunto, vamos ver que, com o conhecimento disponível, até que essas crenças não pareciam tão malucas. Quem visse fósseis em rochas ou tartaruguinhas surgindo na areia ficaria facilmente confuso.
Mas à medida que surgiam novas descobertas questionava-se mais essa teoria, mas ela foi objeto de grandes polêmicas entre cientistas e só cairia definitivamente em descrédito no século XIX, depois dos experimentos de Pasteur.
Os vermes da carne
Um golpe sério contra a geração espontânea foi dado em 1688, quando o médico Francesco Redi desenvolveu várias experiências para mostrar que as moscas surgidas em alimentos em decomposição provinham de larvas e não da matéria em putrefação.
Inicialmente, Redi colocou carne em frascos, alguns fechados, outros abertos. Logo observou que, nos primeiros, não apareciam larvas. Mas ele não parou por aí. Na tentativa de provar que não fora a ausência do ar que impedira o surgimento dos vermes, concebeu um novo experimento, colocando carne em três frascos:
O primeiro jarro (A) ficou aberto. Logo, observou as moscas pousando na carne e depositando seus ovos. Em pouco tempo, a carne estava cheia de vermes.
O segundo jarro (B) foi bem fechado. Como na experiência anterior, o jarro não atraiu as moscas e não surgiram vermes na carne.
O terceiro jarro (C) foi coberto com um pano, que permitia a passagem do ar. As moscas foram atraídas pelo cheiro da carne. Como não conseguiram penetrar no jarro, depositaram seus ovos no pano. Em pouco tempo, havia vermes movendo-se sobre o pano, mas nenhum chegou à carne.
Embora bem elaborada e convincente, a experiência de Redi não acabou com as dúvidas sobre a possibilidade da geração espontânea. No entanto, foi a base para a construção de despensas para estocagem de alimentos, onde telas impedem a entrada de insetos.
Obs: Inspirado em um módulo da primeira versão da exposição Vida (1995). Curadores: Nísia Trindade, Luis Otávio Ferreira e Luis Antônio Teixeira.
Data Publicação: 29/11/2021