Monkeypox, que tem se espalhado pelo mundo, ainda não oferece motivos para pânico
O ano de 2022 vem com um novo alerta no campo da saúde: monkeypox. A doença que, até então, circulava de forma limitada em alguns países africanos, agora, foi registrada também na Europa, nas Américas, na Ásia e na Oceania. Em julho, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que a monkeypox constitui uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional. O primeiro caso foi confirmado no Brasil em junho. Já a primeira morte no país foi registrada no final de julho. Mas que doença é essa? Devemos nos preocupar? As dúvidas ainda são muitas, porém, especialistas destacam que, apesar de a situação exigir atenção, não há motivo para pânico. Então, calma! Que tal conhecer mais sobre o tema? Afinal, nada melhor do que informação para ajudar a lidar com um assunto!
Que vírus é esse?
A monkeypox é causada por um vírus do grupo dos ortopoxvírus. Nesse mesmo grupo, está o vírus causador da varíola humana, doença erradicada do mundo em 1980, graças à vacinação em massa. Ambos os vírus possuem semelhanças, porém, não são iguais.
As doenças causadas por ortopoxvírus têm algumas características em comum, entre elas, a capacidade de causar lesões na pele. Tanto a monkeypox quanto a varíola humana geralmente começam com sintomas como febre, dores de cabeça, musculares e nas costas, além de calafrios e exaustão. Mas, diferentemente da varíola humana, a dos macacos provoca com frequência o inchaço de gânglios linfáticos, órgãos que estão presentes nas axilas, virilha e pescoço. Nas duas doenças, lesões e bolhas também começam a surgir na pele em até três dias após o início da febre. Enquanto, na monkeypox, a face, as palmas das mãos e as solas dos pés estão entre as áreas do corpo mais afetadas, na varíola humana o tronco é mais acometido.
A infecção também é chamada de autolimitada, pois, em geral, acomete a pessoa, evolui para lesões na pele, mas, depois, tende a ser resolvida. O risco de agravamento é maior em crianças, gestantes e pessoas com a defesa do corpo comprometida. Os sintomas podem durar de duas a quatro semanas.
Se, por um lado, os sintomas são parecidos, a monkeypox e a humana diferem em outros aspectos. A doença relacionada aos surtos atuais é menos transmissível, gera quadros menos graves e está associada a menos mortes. Enquanto a varíola humana matava cerca de 30% das pessoas infectadas, o número de vítimas fatais por monkeypox varia entre 3% e 11%.
Se é de macacos, por que está afetando humanos?
A resposta para esta pergunta está lá atrás, na época em que a monkeypox foi descoberta. Ela recebeu esse nome porque o vírus foi identificado pela primeira vez em macacos que foram levados da África para um laboratório de pesquisa na Dinamarca em 1958. Apesar da descoberta nos primatas, hoje em dia, o vírus já foi detectado em vários animais, entre eles, em várias espécies de macacos e de roedores. O reservatório natural da infecção ainda é desconhecido, sendo possivelmente os roedores.
Fig 3. O vírus da monkeypox é encontrado em vários primatas, mas também em diferentes espécies de esquilos e outros roedores de países africanos. Créditos em sentido horário: Anneli Moeller/ Wikimedia Commons; derekkeats/ Wikimedia Commons; tontantravel/Wikimedia Commons e H. Osadnik/Wikimedia Commons
A infecção é uma zoonose, ou seja, que se originou em animais, mas “pulou” para os humanos. Esse “pulo” pode acontecer, por exemplo, a partir do consumo de carne e de produtos de origem animal contaminados e que foram malcozidos, bem como pelo contato com fluidos corporais e lesões de animais contaminados.
Uma vez que o vírus já está no ser humano, a transmissão também pode ocorrer de pessoa para pessoa. O contato com secreções, fluidos corporais, lesões na pele e com objetos contaminados, por exemplo, roupas de vestir e de cama pode transmitir monkeypox. O mesmo pode acontecer com as gotículas respiratórias, especialmente em conversas frente a frente por um período prolongado. No entanto, vale lembrar que a transmissão por via respiratória não é tão eficiente quanto a da Covid-19.
Como surgiu a monkeypox?
O primeiro registro da monkeypox nos seres humanos foi em 1970, em um menino de nove meses de idade da República Democrática do Congo. Desde esta década, a maioria dos casos tem sido reportada no continente africano, especialmente na África Central e Ocidental. Em cada uma dessas regiões, prevalece uma variante diferente do vírus. Enquanto o vírus da monkeypox originário da África Central está associado a uma doença com sintomas mais severos, o da África Ocidental é mais brando e menos letal. Estudos indicam que, entre os infectados com essa variante, cerca de 4 em cada 100 pessoas morrem. O número é inferior aos 11 óbitos em 100 infectados que citamos anteriormente e que está associado à variante da África Central. Esses dados são importantes porque – felizmente! – já se sabe que a variante da África Ocidental tem causado os surtos atuais.
A identificação de pessoas infectadas fora da África até então era rara e, em geral, estava conectada de alguma maneira ao continente africano. Os casos ocorriam, por exemplo, em pessoas que haviam viajado para a região. Agora, no entanto, não é possível estabelecer essa conexão. Segundo a OMS, tudo indica que, com o aumento do monitoramento, mais casos serão detectados fora do continente africano.
Um dos fatores que pode estar favorecendo esse avanço é o fato de, apesar da vacina contra a varíola humana ser 85% eficiente contra monkeypox, ela já não é mais utilizada e produzida em larga escala no mundo. Pessoas com menos de 40 anos de idade não foram vacinadas contra a doença, ou seja, já não estão mais protegidas contra a infecção atualmente.
O que se sabe sobre os surtos atuais de monkeypox?
Ao analisar os casos atuais da doença, pesquisadores identificaram que boa parte deles, principalmente na Europa, está relacionada a eventos que agregaram muitas pessoas de países diferentes. Uma das hipóteses dos cientistas é que infectados no continente africano possam ter transmitido o vírus durante festas que ocorreram na Espanha e em outros países. A partir daí, houve o espalhamento do vírus e a perda da conexão direta entre os casos e o histórico de contato com regiões de circulação da doença.
Embora muitos casos fora da África tenham ocorrido em homens que fazem sexo com outros homens, é importante ressaltar que o vírus se espalha pelo contato próximo (não necessariamente sexual) entre pessoas de qualquer orientação sexual.
Ainda faltam informações para especular sobre como será a evolução da doença no mundo, porém, alguns aspectos contribuem para uma visão mais otimista. Já falamos, por exemplo, do seu menor potencial de gravidade e de letalidade quando comparada à varíola humana. Além disso, os casos estão associados à variante que causa menos sintomas e é menos letal.
Outro detalhe importante é o material genético. O vírus da monkeypox, assim como o da varíola humana, guarda sua informação genética em uma molécula de DNA, enquanto o da Covid-19 guarda em RNA. Os vírus de DNA conseguem corrigir de forma mais eficiente erros durante o processo de duplicação do material genético do que os de RNA. Com isso, vírus de DNA acumulam menos variações genéticas e acabam gerando menos variantes diferentes.
Vale lembrar ainda que existem antivirais aprovados por agências internacionais para tratamento da monkeypox, tal como o tecovirimat, cidofovir e brincidofovir, entretanto, não estão amplamente disponíveis. Em agosto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a liberação para uso do medicamento tecovirimat no país. Outro ponto positivo é que vacinas capazes de promover proteção eficiente contra a doença já foram desenvolvidas. A Anvisa também aprovou a liberação para uso de uma vacina no país (Jynneos/Imvanex).
Apesar de termos razões para otimismo, a doença já alcançou cerca de 90 países. A situação exige atenção, e o sistema de vigilância está ativado.
Fontes consultadas:
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WHO. Multi-country monkeypox outbreak in non-endemic countries. https://www.who.int/emergencies/disease-outbreak-news/item/2022-DON385. Publicado em 21 de maio de 2022. Acessado em 31 de maio de 2022.
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Por Teresa Santos, com colaboração de Miguel de Oliveira
Atualizado em 30 de agosto de 2022.