Este texto é uma adaptação da coleção Culturas Estelares, do Museu da Vida Fiocruz. Você pode conferir este e outros conteúdos no site!
Conheça os mitos e curiosidades do céu Tupi-Guarani
O Dia Internacional dos Povos Indígenas é celebrado em 9 de agosto, em data criada pela Organização das Nações Unidas (ONU) no ano de 1994. No texto, conheça a cultura estelar de um dos povos indígenas mais numerosos do Brasil: os Tupi-Guarani.
É possível encontrar na literatura várias menções sobre a importância do céu no processo evolutivo da humanidade. Foi observando o céu que diferentes povos desenvolveram mecanismos como de marcação do tempo, de orientação no espaço geográfico e de organização das tarefas diárias.
Para muitos povos indígenas, como os Tupi-Guarani, a relação tempo-espaço-vida está ligada à compreensão de fenômenos naturais relativos aos períodos de chuva e de seca, dos ciclos de dia e noite, das fases da Lua, das estações do ano, entre outros.
O povo Tupi-Guarani
Os povos indígenas Guarani habitam a América do Sul, em territórios da Argentina, Paraguai, Brasil e Bolívia.
O termo ‘Tupi-Guarani’ é usado para designar uma família pertencente ao tronco linguístico Tupi. Um tronco linguístico é um conjunto de línguas diferentes, mas que partem de uma origem comum, que preserva semelhanças estruturais e fonéticas. Os povos indígenas desse tronco linguístico estão relacionados, historicamente, aos Tupis (ou Tupinambás).
Logo abaixo, conheça a visão de mundo desse povo tradicional.
A origem do Universo e o céu Tupi-Guarani
No Universo Guarani, o pai de toda criação é Nhanderu. Ele criou quatro deuses que o ajudaram na formação da Terra e de seus habitantes, conforme descrito na obra ‘Resistência Guarani – uma Vivência na Aldeia’ (ver Culturas Estelares – volume 1, pág. 43).
- – Nhanderu representa o Zênite (o ponto mais alto no céu em relação a um observador na Terra). Já os quatro deuses principais representam os pontos cardeais.
- – Jakaira (Norte) é o deus da neblina e das brumas que abrandam o calor, origem dos bons ventos.
- – Nhamandu (Sul) é o deus do Sol e das palavras, representa o tempo-espaço primordial.
- – Karai (Leste) é o deus do fogo e do ruído do crepitar das chamas sagradas.
- – Tupã (Oeste) é o deus das águas, do mar e de suas extensões, das chuvas, dos relâmpagos e dos trovões.
As constelações do céu Tupi-Guarani
Ainda de acordo com a obra literária, o calendário Guarani está associado à trajetória aparente anual do Sol e é dividido em tempo novo (ara pyau) e tempo velho (ara ymã).
Ara pyau compreende o período de chuva e está relacionado com as estações da primavera e verão do Hemisfério Sul (austrais), onde pode-se observar as constelações da Anta (Tapi’i) e do Homem Velho (Tuya’i).
Assista ao documentário ‘Do Meu Canto Conto Eu – ARA PYAU’:
Já ara ymã marca o período da seca e compreende as estações de outono e inverno do Hemisfério Sul, podendo ser observadas as constelações do Veado (Guaxu) e da Ema (Guyra nhandu).
As constelações são usadas durante o ano todo e podem ter diversas finalidades, desde práticas ritualísticas, narrativas mitológicas às técnicas produtivas.
Os indígenas há muito perceberam que as atividades agrícolas dependem das flutuações sazonais e, portanto, a interpretação dos movimentos celestes se faz necessária para a subsistência da comunidade.
A partir das imagens estelares formadas no céu, os povos originários conseguem saber se é tempo de mudança de estação e, desse modo, se programam para o período de caça, pesca, plantio e colheita.
Vale ressaltar que os significados e usos das constelações possuem relação direta com os costumes e territórios ocupados por esses grupos.
A seguir, navegue pelos pôsteres artísticos e interativos de representações mitológicos de quatro importantes constelações indígenas. A cada pôster, viaje pela cultura estelar do céu Tupi-Guarani e descubra particularidades dessas constelações que são consideradas marcadores temporais.
A constelação da Anta do Norte (Tapi’i)
A constelação do Homem Velho (Tuya’i, Tuivaé)
A constelação da Ema (Guyra nhandu)
A constelação do Veado (Guaxu)
Este artigo busca chamar a atenção para a importância da mobilização de toda a sociedade em defesa pela legitimação e demarcação das terras indígenas como forma de manutenção dos povos originários e, por assim dizer, pela preservação da nossa história.
Você pode conhecer mais sobre o céu Tupi-Guarani e de outros povos nos quatro volumes da Coleção Culturas Estelares.
Veja também os quizzes, interativos e outras coleções astronômicas do Museu da Vida Fiocruz: Os Mensageiros das Estrelas, Viagem ao Universo em 88 Constelações e o Livro de Colorir O Universo em 88 Constelações.
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Fontes consultadas:
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Por Izabela Rodrigues e Bruno Oliveira, sob supervisão de Paulo Henrique Colonese. Adaptado por Renata Bohrer para o Invivo.
Data Publicação: 09/08/2023
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