Fig 1. Método Wolbachia libera no ambiente Aedes aegypti com bactéria que reduz a capacidade do mosquito de transmitir doenças. Crédito: Kwangmoozaa / Getty Images
Conheça o método Wolbachia, que tem reduzido o número de casos de dengue e outras doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti
Você sabia que a liberação proposital de mosquitos no ambiente pode ajudar a reduzir algumas doenças que eles transmitem? Sim! Estamos falando do método Wolbachia! Mas, calma! Não é pra sair liberando qualquer mosquito em lugares variados! Esses são Aedes aegypti que ganharam um ingrediente especial em laboratório: bactérias! E eles só são soltos na natureza após muito estudo e planejamento. É pura ciência!
O que é Wolbachia?

Fig 2. Célula de inseto observada em microscópio eletrônico. Os três círculos destacados com seta vermelha são bactérias Wolbachia. Crédito: Scott O’Neill / Wikimedia Commons/adaptado por Invivo
Wolbachia é o nome de um grupo de bactérias que infectam insetos, por exemplo, moscas-das-frutas, mariposas, libélulas, abelhas e borboletas. Essas bactérias são comuns na natureza. Elas estão presentes em cerca de 60% dos insetos.
O grupo Wolbachia foi observado pela primeira vez na década de 1920. Já na década de 1990, estudos de pesquisadores norte-americanos e australianos fizeram descobertas importantes. Primeiro, perceberam que mosquitos infectados por Wolbachia tinham o potencial de substituir populações não infectadas ao longo de várias gerações. Depois, notaram que a presença desses microrganismos era capaz de reduzir o tempo de vida de moscas-das-frutas.
As descobertas acenderam um sinal! Todas essas características tornavam as bactérias Wolbachia uma arma em potencial para o controle de doenças transmitidas por mosquitos.
E assim nasce… O Wolbito!

Fig 3. Larvas do mosquito Aedes aegypti criadas em laboratório. Crédito: Rodrigo Méxas e Raquel Portugal / Fiocruz Imagens
Apesar da estratégia ser promissora, havia um problema. As bactérias Wolbachia não ocorriam naturalmente no Aedes aegypti, mosquito transmissor dos vírus que causam a dengue, Zika, chikungunya e febre amarela urbana.
Mas, nos anos 2000, um grupo de pesquisa australiano conseguiu transferir a bactéria para ovos do mosquito Aedes aegypti em laboratório. E os mosquitos que receberam Wolbachia transmitiram esses microrganismos para seus filhos.
Além disso, os estudos revelaram que a Wolbachia impedia que os vírus se desenvolvessem dentro do Aedes aegypti. Ou seja, os mosquitos com a bactéria têm menor capacidade de transmitir essas doenças.
O mosquito Aedes aegypti que carrega a bactéria Wolbachia passou a ser chamado de Wolbito. E ele, ou melhor, sua liberação no ambiente tornou-se uma ferramenta importante de controle das doenças transmitidas por essa espécie de mosquito.
A ideia é que os mosquitos com Wolbachia liberados na natureza se reproduzam e gerem uma nova população que carrega a bactéria. As fêmeas dessa nova geração continuam picando os seres humanos, mas não transmitem os vírus causadores de doenças.
Fêmeas é que picam!
Tanto machos quanto fêmeas do Aedes aegypti alimentam-se de substâncias açucaradas, como néctar e seiva. No entanto, apenas a fêmea pica o ser humano e outros animais. Ela faz isso porque o sangue é necessário para produção de ovos. Então, são elas que, quando infectadas por vírus, transmitem doenças.

Fig 4. Picada do Aedes aegypti. Crédito: Raquel Portugal/Fiocruz Imagens
O método Wolbachia libera mosquitos machos e fêmeas com bactérias. Com isso, a estratégia se torna autossustentável, ou seja, mesmo que não haja mais novas liberações de Aedes aegypti com Wolbachia na natureza, os mosquitos continuam se reproduzindo e as bactérias introduzidas previamente vão sendo transmitidas de geração em geração.
Confira abaixo o resultado de cruzamentos entre mosquitos com e sem Wolbachia.

Fig 5. Quando os Wolbitos são liberados na natureza, surgem diferentes possibilidades de cruzamento que resultam em filhotes com Wolbachia ou na ausência de filhotes. Crédito: Surachet99/Getty Images/adaptado por Invivo
Onde já ocorreu liberação de Wolbitos?
A estratégia de liberação de Wolbitos tem sido feita pelo World Mosquito Program (WMP), uma iniciativa internacional. A ação começou na Austrália, mas expandiu-se para outros 13 países: Brasil, Colômbia, El Salvador, México, Indonésia, Honduras, Laos, Sri Lanka, Vietnã, Kiribati, Fiji, Vanuatu e Nova Caledônia (território francês).

Fig 6. O mosquito Aedes aegypti é originário do Egito, na África, mas vem se espalhando pelo mundo há séculos. O mapa de 2015 mostra como ele já estava presente em vários continentes (áreas amarelas e alaranjadas) naquele ano. Crédito: Moritz UG Kraemer, Marianne E Sinka, Kirsten A Duda, Adrian QN Mylne, Freya M Shearer, Christopher M Barker, Chester G Moore, Roberta G Carvalho, Giovanini E Coelho, Wim Van Bortel, Guy Hendrickx, Francis Schaffner, Iqbal RF Elyazar, Hwa-Jen Teng, Oliver J Brady, Jane P Messina, David M Pigott, Thomas W Scott, David L Smith, GR William Wint, Nick Golding, Simon I Hay / Wikimedia Commons
No Brasil, o Método Wolbachia é conduzido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com financiamento do Ministério da Saúde, em parceria com os governos locais.
A ação já ocorre nos municípios de Campo Grande (MS), Petrolina (PE), Rio de Janeiro (RJ), Niterói (RJ) e Belo Horizonte (MG). Além disso, o projeto segue em fase de implementação em outras localidades, incluindo novos municípios das Regiões Sul, Sudeste e Nordeste do país.
Método é seguro e eficaz
Avaliações de risco desenvolvidas na Colômbia, Austrália, Vietnã e Indonésia mostraram que o risco associado à liberação de Wolbitos na natureza é insignificante, baixo ou aceitável. Também vale lembrar que, como Wolbachia está naturalmente presente em muitos insetos, nós já convivemos com essas bactérias há tempos e não há registro de que já tenham causado danos à saúde.
Quanto à eficácia, um estudo feito na Indonésia revelou que houve uma redução de 77% na incidência de dengue nas áreas em que houve liberação de Wolbitos.

Fig 7. O Word Mosquito Program faz a liberação de Wolbitos adultos e também utiliza um Dispositivo de Liberação de Ovos (DLO). Crédito: Fernando Frazão/Agência Brasil
Os resultados também são animadores no Brasil. A análise em Niterói (RJ) mostrou redução de cerca de 70% dos casos de dengue, 60% de chikungunya e 40% de zika nas áreas que receberam o programa.
Um aspecto importante para o sucesso da estratégia é a inclusão das populações locais no processo. Os cientistas explicam como o Método Wolbachia funciona para moradores das regiões que recebem o Wolbito. Eles também informam sobre o andamento do programa.
Apesar do sucesso, é importante lembrar que o Método Wolbachia não é capaz de resolver o problema das arboviroses sozinho. Ainda precisamos manter as medidas preventivas de forma rotineira. Ou seja, nada de deixar água parada! E se estiver na idade indicada, vacine-se contra a dengue!!
Saiba mais sobre a dengue e o Aedes aegypti:
Vacina contra a dengue no SUS: nova arma de prevenção
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Fontes consultadas:
Brasil, Ministério da Saúde. Você sabe o que é o Método Wolbachia? Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-com-ciencia/noticias/2024/maio/voce-sabe-o-que-e-o-metodo-wolbachia. Atualização: 05 jun 2024.
World Mosquito Program. Sobre o Método Wolbachia. Disponível em: https://www.worldmosquitoprogram.org/sobre-o-metodo-wolbachia.
Ribeiro, Maiara. Drauzio Varella. Bactéria Wolbachia inibe transmissão de dengue e outras arboviroses. Disponível em: https://drauziovarella.uol.com.br/infectologia/bacteria-wolbachia-inibe-transmissao-de-dengue-e-outras-arboviroses/. Revisão: 11 ago 2020
Instituto Oswaldo Cruz, Fiocruz. Dengue: vírus e vetor. Disponível em: https://www.ioc.fiocruz.br/dengue/textos/oportunista.html
Moreira, L, Vieira, A e Chalegre, D. Bactéria Wolbachia: a história do método que se fortalece no combate à dengue no Brasil. Fiocruz. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/noticia/2024/03/bacteria-wolbachia-historia-do-metodo-que-se-fortalece-no-combate-dengue-no-brasil. Publicação: 15 mar 2024.
World Mosquito Program. Randomised Controlled Trial: Indonesia. Disponível em: https://www.worldmosquitoprogram.org/en/randomised-control-trial-rct
Pinto SB, Riback TIS, Sylvestre G et al. (2021) Effectiveness of Wolbachia-infected mosquito deployments in reducing the incidence of dengue and other Aedes-borne diseases in Niterói, Brazil: A quasi-experimental study.
PLoS Negl Trop Dis 15(7): e0009556. https://doi.org/10.1371/journal.pntd.0009556
*Todos os sites foram consultados em 28 jan 2025.
Por Teresa Santos
Data Publicação: 06/03/2025
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