Fig 1. Crianças e jovens no celular: pais devem ficar sempre em alerta e colocar limite de tempo para uso, segundo profissionais da área da saúde. Crédito: FG Trade/iStock

A busca por outras redes sociais levanta questões sobre saúde mental e dependência digital

Como você chegou a este texto? É possível que tenha sido a partir das chamadas redes sociais, plataformas digitais que conectam pessoas ao redor do mundo. Isto porque elas estão cada vez mais presentes na vida de jovens e adultos, que acabam passando muitas horas do dia conectados no celular. Para termos uma ideia da magnitude dessa prática, basta lembrar do que aconteceu quando o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a suspensão da rede social X (antigo Twitter) no Brasil no final de agosto de 2024. Em menos de 15 dias, a rede social Bluesky, que apresenta um formato semelhante ao X, recebeu 2 milhões de novos usuários. Ficam as perguntas: precisamos de novas redes sociais? E como a nossa saúde mental pode ser afetada por elas?

 

Fig 2. Facebook, Instagram, YouTube, TikTok, X e outros exemplos de redes sociais. Crédito: Kenneth Cheung/iStock

 

Brasileiros estão entre os mais conectados do mundo

Segundo o Relatório Digital 2024, da DataReportal, o Brasil é o segundo país com maior consumo diário de internet no mundo. Em média, ficamos conectados diariamente por 9 horas e 13 minutos , ficando atrás apenas da África do Sul. O número representa 3 horas a mais que a média mundial. E, somente nas redes sociais, o brasileiro gasta quase 4 horas do dia.

Esse comportamento também é preocupante em outros lugares do mundo. A pesquisa “Redes sociais e a saúde mental dos jovens”, divulgada pelo Departamento de Saúde dos Estados Unidos em 2023, informa que 95% dos jovens de 13 a 17 anos relatam usar as redes sociais. Um terço deles afirma usar “quase constantemente”.

Na maioria dos países, a idade mínima recomendada para fazer uso de redes sociais é de 13 anos, mas a pesquisa norte-americana de 2023 mostrou que muitas crianças e jovens de 8 a 12 anos já fazem uso das plataformas.

 

E ficar tanto tempo conectado às redes sociais pode prejudicar a saúde mental?

A resposta é sim! De fato, o uso excessivo das redes sociais pode causar danos à saúde da mente. Entre os jovens, isso é ainda mais grave.

De acordo com a pesquisa de 2023 feita nos Estados Unidos, a faixa etária de 10 a 19 anos representa um período sensível, porque o cérebro ainda está em desenvolvimento. É nessa faixa também que flutuações de comportamento começam a ocorrer e que a juventude passa por situações desafiadoras de saúde mental, como a depressão.

 

“O uso frequente das redes sociais pode estar associado a mudanças no cérebro em desenvolvimento na amígdala (importante para o aprendizado emocional e comportamento) e no córtex pré-frontal (importante para controle de impulsos, regulação emocional e moderação do comportamento social) e poderia aumentar a sensibilidade a recompensas e punições sociais”, alerta a pesquisa.

 

Veja abaixo onde essas regiões estão localizadas no nosso cérebro:

 

Fig 3. O esquema apresenta a anatomia do cérebro, destacando em vermelho o córtex pré-frontal e a amígdala. Crédito: jambojam/iStock (adaptado por Invivo)

 

Dependência, depressão, ansiedade e mais

Segundo a psicóloga e doutora em saúde mental Anna Lúcia Spear King, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), uma das questões que causa ansiedade e estresse no jovem é o uso das redes sociais na tentativa de se encaixar nos padrões da pessoa modelo, do chamado corpo perfeito, feliz e popular. “Aqueles que não se veem encaixados nesses padrões começam a apresentar sintomas, se sentem excluídos de grupos sociais”, detalha ao Invivo.

As plataformas de mídias sociais são projetadas para maximizar o engajamento do usuário, ou seja, buscam aumentar o tempo que passamos interagindo nesses sistemas. Mas isso pode levar ao aumento do uso frequente, contribuindo para comportamentos não saudáveis. Notificação, rolagem infinita, curtidas e exibição de popularidade são fatores que podem nos incentivar a querer estar no “engajamento”, às vezes sem perceber.

Especialistas acreditam que a exposição às mídias sociais pode estimular um sistema do cérebro conhecido como centro de recompensa. É nessa região que as informações relacionadas à sensação de prazer são processadas. Quando o estímulo se tornar excessivo, pode desencadear caminhos semelhantes aos que ocorrem em casos de dependência.

No relatório de 2023 dos Estados Unidos, outro dado assusta. Adolescentes que passam mais de três horas por dia em redes sociais têm duas vezes mais chances de desenvolver sintomas de depressão e ansiedade.

O corpo também sofre impactos negativos com o uso de redes sociais

E não é só a mente que fica mal: a saúde do corpo também. Passar muito tempo nas redes pode também gerar impactos em atividades do dia a dia essenciais para a saúde, como o sono e a prática de exercícios físicos. Nisso, não só os jovens são afetados: os adultos também.

Segundo King, algumas possíveis doenças que podem ocorrer são artrite, tendinite, problemas de visão e dores diversas no corpo. Além de estresse, nervosismo, solidão e alterações de humor.

Como perceber e reagir?

A psicóloga lembra que é preciso ficar atento a alguns sinais. Os jovens começam a se isolar no quarto, podem agir com irritabilidade quando impedidos de usar a tecnologia, passam o dia inteiro em um único cômodo da casa. Também podem apresentar falta de higiene, perder o emprego, reprovar de ano na escola, entre outros fatores”, diz. (<— Onde começa essa aspa?)

A pesquisadora em políticas de comunicação e saúde Pâmela Pinto, do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Icict/Fiocruz), comenta que umas das dicas para os jovens que têm dificuldade de concentração para leitura no dia a dia é a educação midiática: “É sobre refletir sobre a nossa presença constante nas redes e pensar em estratégias para a busca de informações”.

O Instagram, segundo ela, é uma das redes mais problemáticas. “Hoje, a gente passa mais tempo desviando de publicidade do que interagindo com pessoas que a gente quer. A nossa atenção é muito preciosa, e existe uma indústria por trás disso. Pessoas mais vulneráveis, como crianças, jovens e idosos, podem ser estimuladas a consumir conteúdo de forma inadequada ou cair em golpes”, alerta.

A prevenção passa por reduzir o tempo nas redes sociais. Um estudo , citado no relatório estadunidense, reporta que adultos e jovens que limitaram o uso diário a 30 minutos durante três semanas melhoraram sintomas de depressão. Portanto, pausas, horários e regras claras para o uso de eletrônicos é uma ação essencial.

 

Fig 4. Saber usar as redes sociais e o celular de forma saudável é um desafio para jovens e adultos hoje em dia. Crédito: Luisella Planeta LOVE PEACE 💛💙 por Pixabay

 

Saiba mais:

Teoria da Mente: compreendendo as intenções dos outros

Como a poluição do ar afeta o nosso cérebro?

 

Fontes consultadas:

Netto, Paulo Roberto. STF determina suspensão do X, antigo Twitter, em todo o território nacional. STF. Disponível em: https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-determina-suspensao-do-x-antigo-twitter-em-todo-o-territorio-nacional-2/. Publicação: 30 ago 2024. Acesso: 11 set 2024

G1. Bluesky diz que ganhou 2 milhões de novos usuários após bloqueio do X no Brasil. Disponível em: https://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2024/09/03/bluesky-diz-que-ganhou-2-milhoes-de-novos-usuarios-apos-bloqueio-do-x-no-brasil.ghtml. Publicação: 03 set 2024. Acesso: 11 set 2024

DataReportal. Digital 2024 Global Overview Report. Disponível em: https://datareportal.com/reports/digital-2024-global-overview-report. Acesso: 11 set 2024

Social Media and Youth Mental Health: The U.S. Surgeon General’s Advisory 2023. Disponível em: https://www.hhs.gov/surgeongeneral/priorities/youth-mental-health/social-media/index.html

 

Por Fernanda Lima

Esse texto é fruto de uma chamada de artigos exclusiva para participantes da 2ª edição da “Oficina de Jornalismo de Ciência e Saúde para Comunicadores Populares”, realizada em 10 de agosto de 2024 no Museu da Vida Fiocruz, Rio de Janeiro (RJ).

Data Publicação: 24/09/2024