Fig 1. Um dos principais sintomas da tuberculose é a tosse persistente por mais de três semanas, seja ela seca ou com secreção. Crédito: Towfiqu barbhuiya/ Unsplash

 

Números elevados de casos de tuberculose no país preocupam especialistas

A tuberculose é uma doença transmitida pelo ar, provocada principalmente pela bactéria Mycobacterium tuberculosis. O número de casos da doença no Brasil vem crescendo nos últimos anos, causando preocupação para as autoridades. De acordo com o Ministério da Saúde, o número de novos casos de tuberculose pulmonar em 2023 atingiu o maior patamar desde 2012, alcançando mais de 84 mil pessoas.

O aumento veio após um período de queda. No período da pandemia de Covid-19, principalmente em 2020, o número de casos reduziu bastante. As ações de distanciamento social contribuíram para essa redução. No entanto, também é importante considerar a falta de notificação de casos no período, a chamada subnotificação. Por medo de se infectar com o novo coronavírus, muitas pessoas deixaram de buscar atendimento médico, prejudicando tanto o diagnóstico da tuberculose quanto a continuidade do tratamento.

Nos anos seguintes, os números voltaram a aumentar. Segundo dados do Painel Epidemiológico do Ministério da Saúde, as maiores incidências da doença em 2023 ocorreram nas regiões Norte e Sudeste, com 57,7 e 42,8 casos por cem mil habitantes, respectivamente.

E como o cenário está nos estados? Em 2023, as piores taxas foram registradas no Amazonas (86,3 casos por 100 mil habitantes), em Roraima (78,9 casos por 100 mil habitantes) e no Rio de Janeiro (73,7 casos por 100 mil habitantes).

Quando observamos os dados por município, encontramos localidades que também se destacam. De acordo com o Boletim Epidemiológico de Tuberculose no Município do Rio de Janeiro 2024, a incidência da doença na cidade durante o ano anterior foi de 114,7 casos por 100 mil habitantes, bem superior à média nacional registrada no mesmo ano (39,7 por 100 mil).

Já os registros do EpiRio – Observatório Epidemiológico da Cidade do Rio de Janeiro apontam para 9.503 notificações da doença em 2023, com alguns bairros registrando números alarmantes.

Em Bangu, na zona oeste do Rio, por exemplo, foram notificados 1.466 casos em 2023. Lá existe o Complexo Penitenciário de Gericinó, um dos locais que concentra mais casos da doença. Mas outros bairros também aparecem no topo da lista. É o caso, por exemplo, da Rocinha, na zona sul da cidade, com 358 notificações de tuberculose em 2023.

 

Fig 2. O mapa da cidade do Rio de Janeiro revela a concentração de casos novos de tuberculose pulmonar em 2023. Os números indicam Áreas de Planejamento em saúde. Quanto mais escuro o tom de vermelho, maior a concentração de casos da doença. Crédito: Boletim Epidemiológico Tuberculose no Município do Rio de Janeiro, 2024.

 

A favela da Rocinha mantém um longo histórico da doença. Segundo matéria publicada no jornal El País e republicada no site do Conselho Federal de Enfermagem em 2016, a incidência da doença girava em torno de 370 casos por 100 mil habitantes. Em 2019, obras de infraestrutura realizadas pelo governo e que promoveram o alargamento de ruas, entre outras medidas de urbanização, melhoraram o cenário. No entanto, os dados mostram que a situação ainda está longe da ideal.

 

Mas por que favelas e presídios têm tantos casos da doença?

A médica infectologista Valéria Rolla, do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), explica que a transmissão da tuberculose é potencializada em moradias com falta de luz solar, pouca ventilação e compartilhamento de quartos entre diferentes pessoas. Essas características são frequentes em complexos penitenciários e em áreas socialmente vulnerabilizadas, tal como as favelas.

“Os ambientes com ventilação adequada, com portas e janelas abertas, dificultam a transmissão, porque a ventilação leva o Mycobacterium tuberculosis embora do ambiente. Já a luz solar mata a bactéria”, explica.

 

Fig 3. A bactéria Mycobacterium tuberculosis, causadora da tuberculose, se espalha por meio de gotículas de saliva que se espalham quando falamos, espirramos ou tossimos. Crédito: Janice Carr /Wikimedia Commons / Domínio Público.

 

Os dados reforçam o peso que a questão socioeconômica tem quando o assunto é tuberculose. Segundo registros do painel de Tuberculose do Ministério da Saúde, a doença atinge mais os homens (68%) e, em particular, as pessoas negras (60%).

O enfermeiro Paulo Victor Viana, pesquisador do Centro de Referência Professor Hélio Fraga da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz), ressalta que a tuberculose está fortemente associada à pobreza, uma vez que as condições de vida precárias, como moradias superlotadas, mal ventiladas e sem saneamento adequado, facilitam a propagação da doença.

 

Atenção aos sinais de alerta!
Fique atento à tosse persistente por mais de três semanas, febre, emagrecimento sem motivo, cansaço ou fadiga e suor à noite. Outros sinais que podem surgir são dor ao respirar ou tossir, sensação de falta de ar, palidez e fraqueza. Mas o principal sintoma da tuberculose pulmonar é a tosse, que pode ser seca ou com catarro.

 

Mas como se pega tuberculose?

Segundo o Ministério da Saúde, a tuberculose é transmitida por vias respiratórias, por meio de gotículas de saliva liberadas pela tosse, fala ou espirro de uma pessoa doente. As gotículas contêm as bactérias causadoras da doença.

Quando outras pessoas inalam essas gotículas, elas podem se infectar. Estima-se que, ao longo de um ano, uma pessoa com tuberculose sem tratamento pode infectar de 10 a 15 pessoas.

Segundo Valéria Rolla, as crianças e os idosos são os mais vulneráveis à doença: “Isso porque o sistema imune das crianças não se desenvolveu de forma plena, e o dos idosos acaba ficando mais frágil com o avançar da idade”.

Por outro lado, a tuberculose não é transmitida por uso compartilhado de objetos. Bactérias que ficam em roupas, lençóis, copos ou talheres raramente se espalham em aerossóis.

 

E como é o tratamento da tuberculose?

Para as pessoas com sintomas, o tratamento tem duração de seis meses e é disponibilizado de forma gratuita no Sistema Único de Saúde (SUS). Viana alerta que, quando o tratamento não é seguido corretamente, há o risco de as pessoas desenvolverem resistência aos medicamentos, o que é conhecido no meio médico como tuberculose drogarresistente.

“Isso significa que os remédios comuns deixam de funcionar, tornando a tuberculose muito mais difícil de tratar e mais perigosa. Nesses casos, tanto para o paciente quanto para a comunidade, o tratamento aumenta muito, podendo alcançar entre 18 e 24 meses”, destaca o enfermeiro.

Uma das formas de prevenir a tuberculose é manter o calendário vacinal em dia desde os primeiros meses de vida. A vacina BCG, aplicada em bebês e crianças de até cinco anos de idade, protege principalmente contra as formas graves da doença. Ela faz parte do Programa Nacional de Imunizações (PNI) desde 1977.

 

Fig 4. A vacina BCG, disponível no SUS, protege contra casos graves de tuberculose. Crédito: Getty Images

 

Fontes consultadas:

Brasil, Ministério da Saúde. Tuberculose – Painel Epidemiológico. Disponível em: https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMGI0YTk1MTMtNWM5ZS00MGI0LWI2NjgtZGI3OWMxNmVlOTgxIiwidCI6IjlhNTU0YWQzLWI1MmItNDg2Mi1hMzZmLTg0ZDg5MWU1YzcwNSJ9.

Brasil. Ministério da Saúde. Tuberculose. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/t/tuberculose.

Conselho Federal de Enfermagem. Tuberculose na Rocinha expõe o Brasil que estacionou no século XIX. Disponível em: https://www.cofen.gov.br/tuberculose-na-rocinha-expoe-o-brasil-que-estacionou-no-seculo-xix/. Publicação: 30 set 2016.

Fiocruz. Tuberculose. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/doenca/tuberculose.

Silva, L.M, Da Silva, G.D., Silva, A.B.O.et al. The tuberculosis scenario in Brazil: impacts of the COVID-19 pandemic on unreporting and discontinuity of treatment
Brazilian J Health Rev. 2022; 5:21067-21081. doi:10.34119/bjhrv5n5-260

COFEN. Tuberculose na Rocinha expõe o Brasil que estacionou no século XIX. Disponível em: https://www.cofen.gov.br/tuberculose-na-rocinha-expoe-o-brasil-que-estacionou-no-seculo-xix/#:~:text=Esta%20favela%2C%20localizada%20na%20zona,por%20100.000%20habitantes%2C%2011%20vezes. Publicação: 30 set 2016

ENSP Fiocruz.Tuberculose e covid-19 na Rocinha: doenças diferentes, desafios similares. Disponível em: https://informe.ensp.fiocruz.br/noticias/49815. Publicação: 25 ago 2020

Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro / Secretaria Municipal de Saúde (SMS-Rio) / Subsecretaria de Promoção, Atenção Primária e Vigilância em Saúde (SUBPAV) / Superintendência de Vigilância em Saúde (SVS) / Centro de Inteligência Epidemiológica (CIE). Boletim Epidemiológico Tuberculose no Município do Rio de Janeiro 2024. Disponível em: https://epirio.svs.rio.br/wp-content/uploads/2024/03/Livro_BoletimEpidemiologicoTuberculose2023_PDFDigital_20240325.pdf

Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro/ Secretaria Municipal de Saúde (SMS-Rio) / Epi Rio. Doenças Transmissíveis crônicas- Tuberculose. https://epirio.svs.rio.br/painel/doencas-transmissiveis-cronicas/

* Todos os sites foram acessados em 3 de outubro de 2024.

 

Por Fernanda Lima. Colaborou Teresa Santos.

Esse texto é fruto de uma chamada de artigos exclusiva para participantes da 2ª edição da “Oficina de Jornalismo de Ciência e Saúde para Comunicadores Populares”, realizada em 10 de agosto de 2024 no Museu da Vida Fiocruz, Rio de Janeiro (RJ).

Data Publicação: 01/11/2024