Moda sustentável cresce em regiões periféricas do país

Fig 1. A reciclagem de tecidos é uma das formas de reduzir o impacto da indústria têxtil na natureza. Crédito: Alexandre Stehling/Remexe

Esse texto é fruto de uma chamada de artigos exclusiva para participantes da “Oficina de Jornalismo de Ciência e Saúde para Comunicadores Populares”, realizada em 19 de agosto de 2023 no Museu da Vida Fiocruz, Rio de Janeiro (RJ).

Conheça iniciativas de favelas e aldeias indígenas que têm dado novo significado ao jeito de fazer moda

Você já parou para refletir sobre a quantidade de roupas que já usou ao longo da vida? E já se perguntou o que acontece com elas quando deixam de ser usadas? Anualmente, o Brasil produz 170 mil toneladas de resíduos têxteis, isto é, roupas velhas e retalhos da indústria da moda. Mas apenas 20% deste material é reciclado, segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). A boa notícia é que cada vez mais marcas de moda estão incorporando práticas sustentáveis e responsáveis, ou seja, produzindo roupa de forma consciente.

Mas por que é necessário repensar a moda?

A indústria da moda é a segunda mais poluente do mundo, ficando atrás apenas da indústria do petróleo. O modelo de consumo conhecido como “fast fashion”, que se traduz literalmente como “moda rápida”, tem impactado de forma negativa o ambiente. E isso se dá pela produção massiva de roupas, comercializadas a preços baixos por grandes varejistas e que também são descartadas de forma rápida pelo consumidor. Tudo fica ainda pior com o crescimento das vendas de roupas pela internet.

“A essência do problema não está sendo encarada. O tecido é muito agressivo para o meio ambiente, muitas vezes até mais do que o plástico”, explica Anna Carolina Figueiredo, pesquisadora do Instituto Sustentabilidade Têxtil e Moda, organização que nasceu no Núcleo de Apoio a Pesquisas da Universidade de São Paulo (USP).

Essas roupas, com ciclos de vida curtos, acabam sendo descartadas em aterros sanitários e lixões, onde muitas vezes levam anos para se decompor. O ideal, segundo Anna, é evitar descartar roupas no lixo e, sempre que possível, doá-las.

O problema, no entanto, não se limita ao descarte inadequado. O processo de produção também tem impactos negativos. As tintas tóxicas usadas no tingimento, por exemplo, podem contaminar as águas dos rios, enquanto possíveis agrotóxicos usados na colheita do algodão prejudicam o solo. A utilização de materiais têxteis derivados do petróleo é outro problema, uma vez que podem levar até 400 anos para se decompor. E há ainda a poluição do ar, que pode ocorrer devido à emissão de gases poluentes na atmosfera.

Fig 2. Segundo o estudo ‘Fios da Moda: Perspectiva Sistêmica para Circularidade’, lançado em 2021, o algodão é a quarta cultura que mais consome agrotóxicos no Brasil, o que equivale a 10% do volume total de pesticidas usados no país. Crédito: mvp64/iStock

Em busca de uma moda mais sustentável

Mas nem tudo está perdido! Iniciativas de moda sustentável estão surgindo cada vez mais no país e no mundo. E elas enxergam nesse novo modelo de produção um meio de promover a coletividade, a criatividade e gerar renda de forma consciente e econômica.

“Essa visão da moda ancestral, com moda sustentável, envolvendo reciclagem de tecidos e tinturas naturais está acendendo uma chama em muitas mulheres”, conta Kezia Borari, fundadora e estilista da marca Tucandeira, da Aldeia Curucuruí, próximo ao Alter do Chão (PA), na Região Norte do país.

As novas marcas utilizam, por exemplo, materiais retirados da natureza como sementes, conchas, palhas e “coisas sagradas”, além de tingimento natural de tecidos e o reaproveitamento de roupas ou retalhos doados. “Não é uma roupa que apenas você está vestindo. Você está se protegendo e [também está] ligado com a floresta”, ressalta Kezia.

Fig 3. O tingimento natural é feito a partir de pigmentos extraídos de produtos naturais, por exemplo, sementes, folhas, cascas de árvores, raízes. Crédito: sornwut tubtawee/iStock

Do outro lado do Brasil, na maior favela de Minas Gerais, no Aglomerado da Serra, a marca Remexe também vem utilizando doações e peças garimpadas de brechós para produzir uma moda mais consciente desde 2017. E, além disso, tem contribuído para transformar a vida dos moradores que participam dessa iniciativa.

“Pensar na questão social de ajudar as pessoas, conseguir profissionalizar, pagando a galera e ofertando emprego, já é uma grande satisfação”, opina Halisson Naninne, estilista e costureiro da Remexe.